Quais os fundamentos e os procedimentos para a intervenção federal?

É a primeira vez nos 30 anos de vigência da Constituição Federal de 1988 que foi decretada a INTERVENÇÃO FEDERAL em algum Estado da Federação. Trata-se de uma ferramenta constitucional excepcionalíssima (um “elemento de estabilização constitucional”), que somente pode ser decretada pelo Presidente da República, nas hipóteses do artigo 34, da Constituição Federal, dentre elas, “pôr termo a grave

Quais os fundamentos e os procedimentos para a intervenção federal?

comprometimento da ordem pública” (e esse foi o fundamento do Decreto publicado hoje.

Pois bem, no dia 16 de fevereiro de 2018, foi publicado no Diário Oficial da União o Decreto 9.288/2018, decretando a intervenção federal no Rio de Janeiro, cujos temas polêmicos descreveremos a seguir nesse post.

Vejamos algumas questões mais relevantes:

QUEM PODE DECRETAR? Segundo a Constituição Federal, a decretação da intervenção é de responsabilidade do Chefe do Poder Executivo. Em se tratando de intervenção federal, a responsabilidade é do Presidente. Em alguns casos, ela poderá ser decretada de ofício pelo Presidente. Como afirmarmos na página 1.387 do nosso “Curso de Direito Constitucional”, “cabe intervenção para ‘pôr termo a grave comprometimento da ordem pública’ (art. 34, III, CF). Dessa maneira, caso a União (por parte do Presidente da República) entenda que a ordem pública está sensivelmente abalada no Estado, não tendo o Estado-membro capacidade de manter a ordem, poderá ser decretada a intervenção”.

A INTERVENÇÃO FOI DECRETADA NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO? Não! A Constituição Federal somente permite a intervenção federal no Estado ou no Distrito Federal. A União não pode intervir diretamente em Município (exceto nos municípios que façam parte de Territórios Federais - que atualmente não existem no Brasil). Portanto, a intervenção foi decretada no ESTADO do Rio de Janeiro. Aliás, é o que dispõe o artigo 1o, "caput", do respectivo Decreto presidencial.

QUANTO O PRAZO DA INTERVENÇÃO? Segundo o artigo 36, § 1o, da Constituição Federal, cabe ao Presidente, no decreto de intervenção, estabelecer o prazo dessa medida. No Decreto publicado hoje, no seu artigo 1o, “caput”, o Presidente da República estabeleceu que a intervenção federal durará até o dia 31 de dezembro de 2018.

QUAL A AMPLITUDE DA INTERVENÇÃO? Cabe ao mesmo decreto presidencial de intervenção estabelecer qual a amplitude do tratado. Poderia, em tese, o Presidente, suspender o Governador do Estado e até mesmo a Assembleia Legislativa do Estado, atribuindo tais funções a um interventor. No caso do Rio de Janeiro, houve uma intervenção PARCIAL nas funções do PODER EXECUTIVO. Isso porque, como dispõe o artigo 1o, § 1o do Decreto publicado hoje, “a intervenção de que trata o caput se limita à área de segurança pública”. Dessa maneira, até 31 de dezembro de 2018, o Governador não é mais o chefe da Segurança Pública no Estado do Rio de Janeiro. O comando da segurança pública passa a ser do interventor, General do Exército Walter Souza Braga Netto, que, por sua vez, é subordinado ao Presidente da República.

PROCEDIMENTO: segundo o artigo 36, § 1o, da Constituição Federal, o decreto de intervenção ser submetido ao Congresso Nacional, no prazo de 24 horas. Primeiramente a Câmara dos Deputados e depois o Senado Federal apreciarão esse decreto de intervenção (podendo aprovar ou rejeitar), por meio de decreto-legislativo, nos termos do artigo 49, IV, da Constituição Federal. No caso concreto, o presente decreto foi aprovado pelas 2 Casas do Congresso Nacional (já que houve a concordância do próprio Governador do Estado, o que raramente ocorre em casos de intervenção). A votação ocorre separadamente nas 2 Casas do Congresso Nacional e o quórum de aprovação é de maioria relativa ou simples (mais da metade dos presentes) desde que estejam presentes pelo menos maioria absoluta dos parlamentares (mais da metade de todos os parlamentares), é que ó quórum de votação.

O CONGRESSO PODE ALTERAR O DECRETO INTERVENTIVO? Não! O Congresso somente pode aprovar ou suspender a intervenção. Não cabe ao Congresso alterar seu conteúdo, pois essa é uma atribuição exclusiva do Presidente, nos termos do artigo 84, da Constituição Federal.

HOUVE ALGUM VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO DE INTERVENÇÃO? De fato, houve um vício formal. Segundo a Constituição Federal (art. 89 e seguintes, CF), antes de decretar intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio, o Presidente deve ouvir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional. Esses dois Conselhos não foram ouvidos previamente. Há uma explicação: todos os Presidentes brasileiros (depois de Fernando Collor) não prestigiaram esses dois Conselhos, que praticamente não se reúnem. Na prática, o Presidente Temer decretou a intervenção na sexta-feira e, na segunda-feira, ouviu às pressas os dois Conselhos, que referendaram a intervenção.

POR CONTA DESSE VÍCIO FORMAL, A INTERVENÇÃO SERÁ DECLARADA INCONSTITUCIONAL? No meu entender, isso é muito pouco provável, por duas razões: primeiramente, porque os Conselhos foram ouvidos dois dias depois, referendando a medida (dir-se-á que o vício foi sanado, já que não houve prejuízo). Outrossim, parece-me o caso de se aplicar a teoria econômica do direito, de Richard Posner, através da qual o julgador deve ter consciência das consequências econômicas e políticas de sua decisão (essa teoria foi utilizada na decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos que não anulou a eleição de George W. Bush contra Al Gore, apesar de ter motivos para tal, por razões políticas e econômicas).

A PARTIR DE QUE MOMENTO VALE A INTERVENÇÃO? A PARTIR DO DECRETO OU A PARTIR DA APROVAÇÃO DO CONGRESSO? A intervenção começa a produzir efeitos a partir do Decreto presencial. Isso decorre da interpretação do próprio texto constitucional. O artigo 49, IV, da Constituição Federal afirma que compete ao Congresso Nacional "aprovar o estado de defesa e a intervenção federal, autorizar o estado de sítio, ou suspender quaisquer dessas medidas". Vejam: assim como o estado de defesa, a intervenção federal, quando decretada, já começa a produzir efeitos. O Congresso poderá APROVAR (o que já existe) ou SUSPENDER (o que já existe).

REFORMA DA PREVIDÊNCIA? Parece-me o assunto está sepultado. Segundo o artigo 60, § 1o, da Constituição Federal, “a Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal...”. Entendo pouco provável a hipótese aventada por alguns: a suspensão da intervenção federal, revogando-se o decreto, somente para aprovação da Reforma da Previdência. Parece-me juridicamente questionável e politicamente imperdoável. Não deve ocorrer. Aliás, dizem alguns que a decretação da intervenção federal no Rio de Janeiro teria sido a maneira de evitar uma previsível derrota do Governo Federal numa tentativa de aprovar a reforma da Previdência, em ano de eleição.

A INTERVENÇÃO FEDERAL IMPEDE SÓ A PROMULGAÇÃO OU TODA TRAMITAÇÃO DA PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL? Embora a Constituição não seja clara (afirma que "a Constituição não pode ser emendada"), fui convencido pelo argumento aventado por vários constitucionalistas: o escopo da Constituição (art. 60) é evitar que, nesse momento de extrema instabilidade, o Congresso Nacional tente alterar a Constituição. Dessa maneira, parece que a melhor interpretação é no sentido de que a intervenção impede qualquer tramitação de emendas constitucionais (e não apenas a promulgação).

QUEM JULGARÁ UM MILITAR, EM CASO DE HOMICÍDIO DE CIVIL? O Código de Processo Penal Militar mudou recentemente, no fim de 2017. Se durante a intervenção federal no Rio de Janeiro um militar das Forças Armadas matar um civil será julgado pela JUSTIÇA MILITAR, diferentemente do que ocorre com policiais civis e militares dos Estados, que, nesses casos, podem ser julgados pelo Tribunal do Júri.

Prof. Flávio Martins

Quais são os princípios que regem a intervenção federal?

Dos princípios que regem a intervenção federal 3.1 Do princípio da excepcionalidade 3.2. Do princípio da taxatividade 3.3. Do princípio da temporalidade 3.4. Do princípio da proporcionalidade 4.

Quais as características da intervenção federal?

forma republicana, sistema representativo e regime democrático; direitos da pessoa humana; autonomia municipal; prestação de contas da administração pública, direta e indireta.

Quais os objetivos da intervenção federal?

Um dos principais objetivos da Intervenção Federal foi recuperar a capacidade operativa dos órgãos de Segurança Pública.

Quem tem competência para decretar a intervenção federal?

A decretação da intervenção é ato privativo do Presidente da República que independe de prévia autorização pelo Congresso Nacional. Por outro lado, após ser decretada, a intervenção deverá ser aprovada ou suspensa pelo Congresso Nacional, conforme dispõe o artigo 49 , inciso IV da Constituição Federal .