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e Saúde: Formação e Trabalho Profissional 22 O Serviço Social reproduz-se como uma especialização do trabalho por ser socialmente necessário: o agente profissional produz serviços que têm um valor de uso, porque atendem as necessidades sociais. Por outro lado, os assistentes sociais também participam, enquanto trabalhadores assalariados, do processo de produção e/ou de redistribuição da riqueza social. Seu trabalho não resulta apenas em serviços úteis, mas ele tem um efeito na produção -ou na redistribuição- do valor e/ou da mais valia e nas relações de poder político e ideológico. Assim, por exemplo, na empresa industrial, o assistente social, como parte de um trabalhador coletivo, participa do processo de reprodução da força de trabalho, essencial à produção da riqueza. Na esfera estatal participa do processo de redistribuição da mais valia, via fundo público. Aí seu trabalho se inscreve, também, no campo da defesa e/ou realização de direitos sociais de cidadania, na gestão da coisa pública. Pode contribuir para o partilha do poder e sua democratização - no processo de construção de uma “contra-hegemonia” no bojo das relações entre as classes - ou ainda, para o reforço das estruturas e relações de poder pré-existentes. Em outros termos, passar da análise profissão para o seu processamento no âmbito de condições de trabalho e relações sociais determinadas representa um avanço importante. Essa perspectiva incorpora os avanços teórico-metodológicos, ético-políticos e técnico-operativos acumulados nas últimas décadas e, ao mesmo tempo, abre um leque de possibilidades, ainda não integralmente exploradas, no sentido de afinar, com maior rigor, as propostas analíticas sobre o Serviço Social com as provocações e desafios enfrentados no dia a dia do trabalho cotidiano. Embora o assistente social disponha de uma relativa autonomia na sua condução de seu trabalho – o que lhe permite atribuir uma direção social ao exercício profissional - os organismos empregadores também interferem no estabelecimento de metas a atingir. Detêm poder para normatizar as atribuições e competências específicas requeridas de seus funcionários, definem as relações de trabalho e as condições de sua realização – salário, jornada, ritmo e intensidade do trabalho, direitos e benefícios, oportunidades de capacitação e treinamento, o que incide no conteúdo e nos resultados do trabalho. E oferecem o back- ground de recursos materiais, financeiros, humanos e técnicos para a realização do trabalho no marco de sua organização coletiva. Portanto articulam um conjunto de condições que As dimensões ético-políticas e teórico-metodológicas no Serviço Social contemporâneo Marilda Villela Iamamoto Serviço Social e Saúde: Formação e Trabalho Profissional 23 informam o processamento da ação e condicionam a possibilidade de realização dos resultados projetados5. Todavia as atividades desenvolvidas sofrem outro vetor de demandas: as necessidades dos usuários, que, condicionadas pelas lutas sociais e pelas relações de poder, transformam- se em demandas profissionais, reelaboradas na ótica dos empregadores, no embate com os interesses dos usuários dos serviços profissionais. É nesse terreno denso de tensões e contradições sociais que se situa a atividade profissional. Portanto, as condições de trabalho e relações sociais em que se inscreve o assistente social articulam um conjunto de mediações que interferem no processamento da ação e nos resultados individual e coletivamente projetados, pois a história é o resultado de inúmeras vontades projetadas em diferentes direções que têm múltiplas influências sobre a vida social. Os objetivos e projetos propostos, que direcionam a ação, têm uma importância fundamental, na afirmação da condição dos indivíduos sociais como sujeitos da história. Como assinala Engels: a vontade move-se pela reflexão e pela paixão. Mas a reflexão e a paixão têm também uma determinação social, porque são impulsionadas por forças propulsoras que agem por detrás dos objetivos. Se os objetivos visados, ao nível individual e coletivo, são produto da vontade, não o são os resultados que dela decorrem, que passam por múltiplos vínculos sociais no âmbito dos quais se realiza a ação. (ENGELS, 1977). 5 - A análise do significado social do trabalho profissional, na ótica da totalidade, supõe decifrar as relações sociais nas quais se realiza em contextos determinados: as condições de trabalho, o conteúdo e direção social atribuídas ao trabalho profissional, as estratégias acionadas e os resultados obtidos, o que passa pela mediação do trabalho assalariado e pela correlação de forças econômica, política e cultural no nível societário. Articula, pois, um conjunto de determinantes a serem considerados: as particulares expressões da questão social na vida dos sujeitos, suas formas de organização e luta; o caráter dos organismos empregadores, seu quadro normativo, políticas e relações de poder que interferem na definição de competências e atribuições profissionais; os recursos materiais, humanos e financeiros disponíveis à viabilização do trabalho. Aliam-se a estes determinantes os compromissos firmados no contrato de trabalho (salário, jornada, benefícios, etc) e sua efetivação, envolvendo padrões de produtividade, formas de gestão, entre outras dimensões, que afetam o conteúdo do trabalho do assistente social. Certamente as respostas acionadas dependem do perfil social e profissional dos assistentes sociais e, em particular, da apropriação teórico-metodológica para leitura dos processos sociais, princípios éticos, a clareza quanto às competências, atribuições e o domínio de habilidades adequadas ao trabalho concreto realizado, o que condiciona a eleição das estratégias acionadas, a qualidade e resultados dos serviços prestados. As dimensões ético-políticas e teórico-metodológicas no Serviço Social contemporâneo Marilda Villela Iamamoto Serviço Social e Saúde: Formação e Trabalho Profissional 24 Logo, não há uma identidade imediata entre a intencionalidade do projeto profissional e resultados derivados de sua efetivação. Para decifrar esse processo é necessário entender as mediações sociais que atravessam o campo de trabalho do assistente social. Concluindo, para atribuir densidade histórica ao projeto profissional é necessário reconhecer as forças sociais que o polarizam. E, concomitantemente, efetuar a análise da organização dos processos de trabalho em que se inscreve o assistente social para estabelecer uma base realista -, sem perder o encanto do sonho e da utopia -, às projeções profissionais e sua viabilização. Exige caminhar da análise da profissão ao seu efetivo exercício, o que supõe articular projeto profissional e trabalho assalariado. 3. O projeto profissional Segundo Netto (1999:95), os projetos profissionais, construídos coletivamente pela categoria, apresentam a auto-imagem da profissão; elegem valores que a legitimam socialmente; delimitam e priorizam seus objetivos e funções; formulam requisitos (técnicos, institucionais e práticos) para o seu exercício, prescrevem normas para o comportamento dos profissionais e estabelecem balizas de sua relação com os usuários dos seus serviços, com outras profissões e com as organizações e instituições, públicas e privadas (entre estes, também e destacadamente, com o Estado, ao qual coube historicamente o reconhecimento jurídico dos estatutos profissionais). Os projetos profissionais são indissociáveis dos projetos societários que lhes oferecem matrizes e valores e expressam um processo de lutas pela hegemonia entre as forças sociais presentes na sociedade e na profissão. São, portanto, estruturas dinâmicas, que respondem